O que fazer com os seus medos?
A vida me ensinou a lidar com os meus medos, Caetano. E quero muito também te ensinar a sair mais forte de cada uma das aflições que você tiver que enfrentar.
Querido Caetano,
Talvez você já tenha percebido, mas ainda assim acho bom te contar. A vida não é uma tarefa fácil, meu filho.
As preocupações sempre vão existir. Tenha você 3 meses e a dúvida se alguém já reparou que você quer leite ou se o abraço do papai vai ser acalentador o suficiente. Tenha você 15 anos e perca o sono pensando na prova de Química ou no encontro com a pessoa que faz seu coração bater mais forte. Tenha você 30 e queime horas do seu dia pensando em como criar seu filho do melhor jeito ou bater a meta da empresa.
Mesmo quando tudo estiver bem, a vida não será fácil. Os desafios do passado e do futuro seguem ativos, mesmo quando o presente está tranquilo.
Transformar a vida em algo difícil de ser vivido faz parte da natureza deste ser hiperproblematizador que são os humanos. No dia em que ganhamos consciência de que éramos um ser e de que tínhamos responsabilidades sobre nós mesmos e sobre outras pessoas, tornamos a vida em algo difícil. Depois disso nunca conseguimos voltar atrás.
Pode parecer louco, mas um animal na savana, prestes a entrar em conflito com um predador, enfrenta uma carga menor de stress do que um ser humano no trânsito.
É por isso, Caetano, que o medo é um tema tão recorrente na nossa sociedade.
Não sei se você notou, mas falei sobre ele, de alguma forma, em todas as outras cartas que te escrevi até agora. Não é para menos. O medo é algo que nos acompanha ao longo de toda a vida e a forma como o encaramos é determinante sobre aquilo que construímos.
Quando eu era pequeno, pouco mais velho do que você, eu era considerado uma criança medrosa. Tinha medo de palhaço (me escondia debaixo da mesa nas festas dos amiguinhos), de altura, de ficar longe da minha mãe. Na verdade, eram tantos medos que nem me lembro ao certo do que eu tinha medo. Acho que era de tudo.
Eu queria viver em uma redoma e, de certa forma, era nela que eu vivia - às vezes posto, às vezes entrando por conta própria.
Hoje olho para trás e reconheço muitos dos motivos que me levaram a isso. Sei que por trás do temor que eu tinha de toda e qualquer lenda urbana, existia um medo da realidade que se impunha aqui dentro.
Demorei para falar do principal desses medos. Foram anos de espera até que o medo de falar sobre o medo não me impedisse mais.
E este dia foi transformador para mim. Tão transformador que me lembro de cada detalhe dele. Me lembro da data exata - era 3 de janeiro de 2010. Me lembro de onde estava sentado. Do rosto das pessoas ao meu redor. De como meu coração batia e de como parecia que ele ia parar de bater a qualquer momento.
Mas ele não parou de bater. Pelo contrário. Falar sobre o que me gerava meus maiores medos mudou muita coisa em mim.
Mudou tanto que, a partir daquele dia, eu deixei de ser visto como uma pessoa medrosa e comecei a ser apontado como alguém corajoso. É engraçado. Ainda hoje, anos depois, a coragem é uma das características que mais elogiam em mim e acho que ela nasceu naquele 3 de janeiro.
Por muito tempo não entendi como poderia ser chamado de corajoso se eu estava, justamente, falando sobre meus medos. Sobre aquilo que me tirava o sono apenas porque não queria que as lembranças reaparecessem nos meus pesadelos.
Mas foi então que eu descobri que a coragem, Caetano, não é a ausência de medo. A ausência de medo não é vantagem. Ela é uma coisa perigosa. Ela não nos mostra os passos falsos onde podemos estar dando.
A coragem, na verdade, é a característica de enfrentar o medo. Falei sobre isso em um vídeo que gravei para o ano novo e uma amiga me lembrou que a Brené Brown, uma grande estudiosa do assunto, diz que “coragem é caminhar no medo”.
É sobre isso que eu quero conversar com você hoje, Caetano. Sobre o quanto “caminhar no medo” nos torna mais fortes.
No mundo dos negócios se popularizou ao longo dos últimos anos o termo “antifrágil”. É um conceito criado por um sujeito que se chama Nassim Taleb e que, em resumo, diz que temos que nos fortalecer perante as adversidades.
Em vez de quebrar, como acontece com algo frágil, ou de nos mantermos imutados, como é a característica dos fortes, temos que aproveitar aquele impacto para nos tornar mais robustos.
Ao longo do tempo, acho que aprendi a ser antifrágil em muitas áreas da minha vida. Foi um processo que me exigiu entender os meus sentimentos e dar tempo para o luto e o lamento que servem de matéria-prima para o fortalecimento esperado.
Quero te ensinar a ser antifrágil, também, meu filho. E para isso, o primeiro passo é te ensinar a falar sobre os seus sentimentos sem qualquer tabu. Sem medo de falar sobre os medos.
Sei que muito em breve você vai começar a verbalizar seus primeiros temores. Vai falar do bicho que mora sob a sua cama. Do menino valentão da escola. De uma história que viu na TV ou ouviu na rua.
Admito que pensar nestes momentos me dá medo. Quero te formar para ser uma pessoa antifrágil, mas para isso eu vou precisar confiar em mim e que você confie em mim. E para você confiar em mim em momento algum eu vou poder diminuir ou desmerecer os seus medos.
Eles existem para serem sentidos e para te guiar na sua caminhada. Quero te ensinar a conhecê-los. A reconhecê-los. A se aliar a eles para os próximos passos.
Por isso eu te peço, meu filho. Lembre-me sempre do medo que eu sinto de não tratar os seus medos com o devido respeito.
Só assim vamos caminhar juntos por eles. E só assim essa caminhada vai nos fortalecer ainda mais a cada dia.
Um beijo,
Papai





Como é difícil ser (e ainda mais difícil ensinar) a ser antifrágil…que tenhamos sabedoria para isso!